Autor:
Rui Dinis
Environmental Business Manager, SGS Portugal
No regresso às aulas, há uma lista de essenciais que importa reter. Mas a qualidade do ar interior nem sempre é uma prioridade. Saiba porque é que devia ser.
O problema é antigo, tal como grande parte do parque escolar nacional, mas tem sido pouca, ao longo dos anos, a atenção dada à qualidade do ar interior nas escolas e à importância de uma ventilação adequada. No regresso às aulas, importa falar também sobre a segurança dos milhares de crianças e jovens que passam grande parte do seu dia em edifícios onde a qualidade do ar deixa muito a desejar.
De facto, a idade de muitas das escolas do País, aliada às questões de financiamento - ou falta deste -, tem atrasado e impedido a realização de melhorias com impacto na qualidade do ar interior e da ventilação. Isto apesar de as crianças serem particularmente suscetíveis a problemas de saúde associados à má qualidade do ar que respiram e de as escolas serem espaços onde passam muitas horas do dia.
Aplica-se a algumas escolas a lei nacional (Art.º 16 da Portaria 101-D/2020) que define a obrigatoriedade da “avaliação simplificada anual da qualidade do ar interior” e mesmo às escolas que não estão abrangidas por esta lei, recomenda-se uma avaliação igualmente anual. Mas todos sabem que nem sempre assim é.
Qualidade do ar interior e saúde: uma relação perigosa
Mas o que define a qualidade do ar interior? De que se trata quando falamos deste tema? Por definição, diz respeito à qualidade do ar no interior, e em redor dos edifícios e estruturas, associada à saúde e ao conforto dos ocupantes desses edifícios.
Em causa está, pois, um inimigo, frequentemente invisível, mas responsável por problemas de saúde em ambientes fechados que podem ir dos mais ligeiros aos mais graves, distinguindo-se entre dois grandes grupos de efeitos causados pelos poluentes do ar interior: os imediatos e os de longo prazo.
Efeitos Imediatos
Quando os efeitos surgem logo após uma exposição ou exposições repetidas a um poluente, o que se pode traduzir em irritação nos olhos, nariz e garganta, dores de cabeça, tonturas e fadiga, estamos a falar de efeitos imediatos, que são, geralmente, de curto prazo.
Tratam-se de situações cuja gravidade depende de fatores como a idade ou problemas de saúde preexistentes, assim como da sensibilidade individual, que varia muito de pessoa para pessoa, e que têm tratamento, tantas vezes tão simples como a eliminação da exposição à fonte de poluição.
Efeitos a longo prazo
Há, depois, outros efeitos para a saúde, os chamados de longo prazo, que podem surgir anos após a ocorrência da exposição ou após longos ou repetidos períodos de exposição. São efeitos que incluem algumas doenças respiratórias, doenças cardíacas e até cancro, podendo ser gravemente debilitantes ou fatais.
Nas escolas, a ciência tem-se debruçado sobre estes efeitos e concluído, invariavelmente, que a falta de qualidade do ar interior prejudica as crianças e jovens, com impacto não só no seu rendimento escolar, mas também na saúde. Pode:
- aumentar a gravidade e a frequência da asma, alergias e outras doenças respiratórias;
- ajudar na transmissão de vírus e bactérias, resultando em mais constipações, gripes e doenças infecciosas graves;
- aumentar o risco de doenças a longo prazo, mesmo potencialmente fatais, como cancro e doenças cardiovasculares, sobretudo entre os funcionários das escolas;
- ser responsável por mais dias de escola e de trabalho perdidos;
- resultar em contas médicas mais elevadas e mais consultas para todos;
- estar associada a défices de atenção e pior desempenho escolar.
Quais as principais causas dos problemas no ar interior?
E quais são, afinal, os responsáveis por esta qualidade indesejada do ar que muitas crianças respiram diariamente nas escolas? As fontes de poluição interior que libertam gases ou partículas são a principal causa de problemas associados à qualidade do ar interior, aliadas a uma ventilação inadequada, que permite o aumento dos níveis de poluentes interiores.
Para estas contas contribuem ainda níveis elevados de temperatura e humidade, capazes de elevar as concentrações de alguns poluentes.
De produtos de tabaco, a materiais de construção e mobiliário (isolamento deteriorado, pavimentos, estofos ou carpetes, armários ou móveis feitos de determinados materiais, produtos para limpeza e manutenção doméstica, sistemas de aquecimento e arrefecimento, excesso de humidade, etc), são várias as fontes internas de poluição do ar nos edifícios, aos quais se juntam ainda as fontes externas.
E cada uma destas pode ser tão ou mais importante consoante a quantidade de poluentes que emitem ou a perigosidade dos mesmos. Há fontes, como é o caso dos materiais de construção ou do mobiliário, que podem libertar poluentes de forma mais ou menos contínua, enquanto outras, como fumar ou utilizar produtos de limpeza, o fazem de forma intermitente.
A ciência confirma o impacto nas escolas
Na União Europeia (UE), a preocupação com a qualidade do ar interior tem sido uma constante, motivo pelo qual foi criado o SINPHONIE, um projeto de investigação com financiamento comunitário, que tem como objetivo avaliar a qualidade do ar interior nas escolas da UE e o seu impacto na saúde das crianças.
Um trabalho cujas conclusões recentes confirmam a preocupação de muitos pais no regresso às aulas. Contas feitas, nos dias letivos, mais de 64 milhões de alunos europeus e quase 4,5 milhões de professores são afetados pela qualidade do ar que respiram no interior das suas escolas.
O documento que resume esta investigação sublinha a relevância do estado dos edifícios escolares e reforça que, para garantir uma boa qualidade do ar nas escolas, é necessário prestar atenção à ventilação e às densidades de ocupação.
Outros trabalhos confirmaram o mesmo, como um estudo realizado em 2021 em 12 salas de aulas de seis escolas da região de Lisboa, que monitorizou as concentrações dos poluentes CO, CO2, COV, PM2.5, PM10 e aldeídos, revelando uma concentração acima dos parâmetros permitidos pela Legislação Portuguesa, Europeia e da Organização Mundial da Saúde para vários poluentes, como o dióxido de carbono (CO2), o PM2.5 e o PM10.
Se pensarmos nas salas de aula nacionais, frequentemente cheias, sobreaquecidas e mal ventiladas, é fácil compreender estes resultados, sobretudo no que diz respeito aos aumentos do CO2, que pode causar diversos problemas quando em níveis elevados.
Num estudo que envolveu 60 escolas escocesas, confirmou-se que os níveis de CO2 mais altos estavam associados a uma frequência média anual das aulas inferior e a piores resultados individuais em testes de leitura, escrita e matemática; numa outra investigação, realizada em 20 salas de aula de vários agrupamentos na Alemanha e em 51 escolas do 1º ciclo em Portugal, verificou-se que o aumento dos níveis de CO2 era responsável pela redução do desempenho da atenção de curta duração dos alunos.
Há, por isso, razões de sobra para a preocupação dos pais e sobretudo para um reforço da inspeção da qualidade do ar interior e do cumprimento dos requisitos relacionados com a ventilação do ar, impostos pelo Decreto-Lei nº 101- D/2020.
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