Nematoides em cana de açucar: identificação e manejo

A cultura da cana-de-açúcar se mantém como uma das mais importantes para o agronegócio em nível de Brasil e mundo. Dos fatores que prejudicam o desenvolvimento da cultura e reduzem a produção, o ataque de nematoides destaca-se como um dos principais. Segundo estudos do setor sucroenergético, aproximadamente, 70% das áreas de cultivo de cana são atacadas por nematoides, acarretando perdas de produtividade que podem ir de 10 até 50%.

As perdas na cultura da cana acarretadas por infestações de nematoides variam, principalmente, em função do nível populacional do parasito, do tipo de solo e da variedade cultivada. Em relação aos nematoides Meloidogyne javanica e Pratylenchus zeae, as perdas em produtividade podem atingir de 20 a 30%, enquanto na situação de ocorrência de M. incognita essas perdas podem ser maiores, podendo alcançar até 40% de perda. Em áreas com níveis populacionais elevados e variedades muito susceptíveis, as perdas provocadas pelos nematoides pode reduzir em até 50% da produtividade.

QUAIS OS NEMATOIDES MAIS COMUNS NA CANA-DE-AÇÚCAR

No Brasil, as espécies de nematoides que têm destaque pelos prejuízos causados na cultura da cana-de-açúcar são Meloidogyne javanica, M. incognita e Pratylenchus zeae, sendo cada uma das espécies com graus de infestação e severidade distintos à cultura, o que causa redução de produtividade dos canaviais, podendo chegar até a 50%.

Durante o desenvolvimento da cana, os sintomas causados por fitoparasitos são de difícil percepção e as irregularidades na lavoura podem ser indicativas da presença de nematoides. Esses sintomas são caracterizados por reboleiras, compostas por plantas de menor porte e cloróticas, murchando nos horários mais quentes do dia.

Os nematoides retiram nutrientes das raízes e ao mesmo tempo injetam toxinas, acarretando deformações e/ou necrose. Em decorrência disso, a absorção de água e nutrientes pelas raízes fica prejudicada e as plantas têm seu desenvolvimento comprometido, apresentando raízes pouco desenvolvidas, com poucas radicelas, culminando em deficiência de nutrientes e consequente mau desenvolvimento da cultura.

Outros gêneros também são encontrados na cultura da cana, sendo eles Helicotylenchus, Mesocriconema, Xiphinema, Tylenchus, Paratrichodorus, Hemicycliophora, Aphelenchus e Aphelenchoides, embora em menor frequência.

Meloidogyne (nematoide formador de galhas)

São nematoides endoparasitos sedentários, com ciclo de vida compreendendo as fases de ovo, juvenil (4 etapas) e adulto. Os nematoides desse gênero possuem um ciclo de, aproximadamente, 37 dias. As galhas são formadas por penetração de indivíduos jovens nos ápices radiculares (pode ocorrer em outros locais também) e desenvolvimento de células de tamanho aumentado nos tecidos das raízes (galhas), o que prejudica o processo de absorção de água e nutrientes.

Os sintomas visuais do ataque desse nematoide consiste em manchas na forma de reboleiras, com plantas pouco desenvolvidas e amarelecidas. As folhas dessas plantas apresentam manchas claras ou necrose internerval. No caso da cultura da cana, o Meloidogyne mais agressivo em termos de infestação e ataque mais severo é o incognita, com formação de galhas no sistema radicular.

Pratylenchus (nematoide das lesões)

Os nematoides das lesões estão presentes em grande parte das regiões importantes produtoras de cana-de-açúcar e podem comprometer seriamente o desenvolvimento da cultura quando em elevadas densidades populacionais. Esse nematoide é caracterizado por ser um endoparasito migrador, os quais alimentam-se de células do córtex das raízes e apresentam grande mobilidade.

Com ciclo de vida também relativamente curto, os nematoides Pratylenchus zeae podem ocorrer em várias gerações numa mesma safra de cana. Com o ataque dessa espécie, as raízes das plantas apresentam-se engrossadas e total ou parcialmente escurecidas, tendo menor absorção de água e nutrientes da solução do solo. Nas raízes das plantas ocorrem, como principais sintomas, áreas necrosadas, resultantes do coalescência das galerias produzidas por vários nematoides. As plantas atacadas possuem menor desenvolvimento, formando reboleiras, porém continuando com a coloração verde.

FATORES IMPORTANTES NA DINÂMICA DOS NEMATOIDES

Os nematoides são microrganismos naturais dos solos, porém, algumas espécies em altas populações, podem ser causadoras de ataques severos às culturas. Algumas características do solo, tais como umidade, textura, temperatura, teor de matéria orgânica e composição da microbiota, são de extrema importância para a dinâmica dos nematoides e sua sobrevivência/permanência.

O solo arenoso é de maior ocorrência de nematoides em cana-de-açúcar, uma vez que é facilitador de disseminação, favorecendo o deslocamento desses microrganismos no solo. A elevada umidade do solo também favorece a alta na população de nematoides.

Na cultura da cana, podemos observar algumas características nas plantas atacadas por nematoides, tais como:

• desuniformidade no porte das plantas (tendo plantas menos desenvolvidas resultantes do ataque dos nematoides)
• tombamento de plantas (isso vai depender do grau de infestação e da severidade)
• menor perfilhamento da planta
• nanismo
• em variedade susceptível ao ataque de nematoides pode ocorrer até 30% de perda de produtividade (depende do grau de infestação)
• pode ocorrer diminuição significativa na longevidade das soqueiras subsequentes

ÉPOCA DE AMOSTRAGEM

A amostragem para identificação de problemas com nematoides varia em pequena magnitude entre as culturas, mas para qualquer cultura a ser amostrada é fundamental a presença de raízes vivas, uma vez que os nematoides são parasitos obrigatórios e necessitam de material vegetal vivo para sobrevivência e reprodução. Para sobrevivência no solo contra as intempéries, os nematoides permanecem na forma de ovos.

Seria mais prático a amostragem em área preparada para plantio, na ausência da cultura, em função da facilidade de caminhamento para coletar as amostras, porém esse levantamento traz poucas informações, uma vez que nessas condições a população de nematoides tende a ser muito baixa (sem planta hospedeira) e no estádio de ovo não é possível diferenciar as espécies.

As populações de nematoides atingem seu ápice em épocas com boa disponibilidade de água (época chuvosa), que compreendem as estações da primavera e verão. No caso da cana-de-açúcar, é conveniente também a amostragem na época chuvosa, uma vez que a cultura perde parte das raízes mais superficiais na época seca do ano.

Lembrando que a variabilidade espacial é muito alta para as populações de nematoides, havendo a necessidade de coletar amostras em vários pontos para serem representativas da área, uma vez que em pequenas distâncias podem ser encontradas populações muito distintas.

No processo de amostragem, o colaborador deve coletar tanto as raízes quanto o solo ao redor das raízes para envio ao laboratório para análise. As plantas devem ser retiradas com o máximo de cuidado para evitar perda de raízes (quebra das raízes). Ao colocar as amostras no saquinho, cuidar para que as raízes permaneçam envoltas por solo, com objetivo de manter umidade mais homogênea na amostra e evitar ressecamento das raízes e o mínimo de incidência de luz.

No caso da cana-de-açúcar, a amostragem pode ser realizada na cana planta e na cana soca. Efetuar a amostragem na soqueira antes do último corte quando a intenção é tomar decisão de controle no próximo plantio na área. Para medidas de controle (em especial aplicação de nematicidas) nas soqueiras, a amostragem pode ser realizada em qualquer ciclo da cultura, inclusive na cana planta. Em ambas as situações deve-se ter o cuidado para uma amostragem criteriosa em termos da época de amostragem e o número de amostras a serem coletadas. O período ideal para início da amostragem é cerca de 30 a 40 dias depois do início das chuvas até 30 a 40 dias após o final da estação chuvosa.

ARMAZENAMENTO DAS AMOSTRAS COLETADAS

As amostras coletadas devem conter grande quantidade de raízes vivas, de preferência raízes mais finas, e solo levemente úmido. Essas condições são atingidas quando realizada a amostragem em período correto e de maneira adequada. As amostras, a medida que vão sendo coletadas, devem ser acondicionadas em sacos plásticos identificados e mantidas em caixas de isopor sem incidência de raios solares e de calor excessivo, para que os nematoides sejam preservados.

Após a coleta, as amostras devem ser enviadas o mais breve possível para o laboratório, podendo ser armazenadas por um curto período. A cultura da cana possui raízes mais grossas e lignificadas e suportam um pouco mais de tempo sem deteriorar, desde que não estejam muito encharcadas.

O armazenamento das amostras deve ser realizado em local fresco (de preferência ar condicionado) e sem incidência de luz direta. A permanência das amostras em geladeira é possível, entretanto, ao saírem das condições de refrigeração, essas amostras deterioram mais rapidamente, por isso não é o modo mais indicado de acondicionamento.

MEDIDAS DE CONTROLE DE NEMATOIDES

Para o controle dos nematoides na cana-de-açúcar, alguns manejos contribuem bastante para redução do nível populacional. A limpeza de máquinas e implementos agrícolas deve receber atenção especial, uma vez que é comum a movimentação desse maquinário entre as áreas.

É comum a ocorrência conjunta de Meloidogyne e Pratylenchus em um mesmo canavial. Uma das espécies prevalecerá dependendo das condições favoráveis para cada uma. Em função da alta severidade e disseminação fácil, o controle dos nematoides nessas áreas fica dificultado no campo.

De uma maneira geral, o controle de nematoides não é uma tarefa fácil e, para isso, é necessária a adoção de um conjunto de medidas de controle. Diante disso, alguns profissionais da agricultura têm substituído gradativamente o termo “controle” pela expressão “convivência e adequação de cultivo”, onde o foco principal não é mais de eliminar o patógeno, mas sim, de reduzi-lo a populações abaixo dos níveis de danos econômicos.

A medida de controle ainda mais desejada é a utilização de variedades resistentes, por ser uma técnica que não implica em custos ao produtor e não causa danos ambientais. O manejo de áreas infestadas tem sido baseado, principalmente, no emprego de nematicidas químicos e biológicos aplicados no plantio e/ou soqueiras.

Dentre os tipos de manejo, alguns são mais eficientes no controle dos nematoides na cana, tais como:

• Adubação verde: tem apresentado resultados significativos, além do incremento de matéria orgânica ao solo. A utilização de adubos verdes tem evidenciado possível redução na adubação nitrogenada devido à fixação biológica de nitrogênio, no caso do uso de leguminosas na adubação verde (em especial, Crotalaria spectabilis, no controle de nematoides das galhas e das lesões radiculares). Dentre as culturas que podem ser usadas nas entrelinhas da cana-de-açúcar como adubo verde estão Crotolaria juncea, Crotalaria ochroleuca, Crotalaria spectabilis, milheto e nabo forrageiro.
• Nematicidas químicos: realizados na semeadura (sulco de plantio) ou em pulverização na cana soca (produto dirigido à base da soqueira da cana). Para utilização desses produtos, o período ideal é entre setembro e abril, que são os meses mais chuvosos.
• Controle biológico: são inimigos naturais dos nematoides e na cultura da cana-de-açúcar o uso de microrganismos como Pochonia chlamydosporia, Paecilomyces lilanus e Bacillus subtilis tem tido resultados positivos comprovados.

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